domingo, 8 de maio de 2011

Lobos em peles de cordeiros: estratégias pastorais para ludibriar os fiéis midiáticos



É comum entre os evangélicos a expressão bíblica “lobos em peles de cordeiros” para representar a capacidade dos enganadores sobre os símplices. E também é comum dizermos “falsos profetas” para referir-se aos ministros logradores das comunidades cristãs (Mt 7:15). Essas expressões, semanticamente exploradas e explicitadas nos contextos, refletem a ojeriza que cidadãos têm diante da corrupção, da falsidade e da insensatez. Em alguns momentos, a reticência é até mesmo diante da falta de educação e do respeito a outrem e, nesse caso, a ingenuidade não é desculpa.

Isto é o que vem acontecendo a partir dos intermináveis ataques entre dois homens de Deus: Caio Fábio e Ricardo Gondin. Eu não quero ser mais um a entrar para o cenário de combates midiáticos, afrontando uns e desalinhavando outros. Quero, sim, dar respaldo às boas argumentações, aos bons entendimentos, às articulações e às excelentes reflexões acerca da ação divina no universo. Quiçá, alhures, contribuir para o enriquecimento da teologia, para a eclesiologia evangélica e para a configuração da liderança cristã brasileira na contemporaneidade. Meu objetivo é dar umas pinceladas no que costumeiramente chamamos de conversa para boi dormir e apontar caminhos para uma renovação da crítica evangélica sobre liderança, pastorado e educação.

Meus estudos teológicos começaram em 1988. De lá para cá, tenho observado (a) os vários movimentos eclesiásticos, cujas intenções são de se apresentar como ponto de referência para o crescimento das igrejas e de possuir as chaves hermenêuticas das técnicas e recursos para a fortificação denominacional; (b) as alternâncias no cenário evangélico-cristão brasileiro e mundial com respeito à referência de liderança; e (c) aos modismos pastorais, cujos perfis apontam para a mediocridade e para o enfraquecimento do grupo evangélico. Para mim, os anos dourados da teologia no Brasil foram resultados de uma ação do Espírito Santo no laicato, cuja força produtiva deu à igreja o crescimento e o desenvolvimento dos fiéis. Foi uma época que, visivelmente, identificávamos a obra do Espírito Santo. Eu não vivi essa época, todavia sou imensamente influenciado por ela. Hoje, arrependo-me das chocarrices que ouço dos líderes evangélicos e das trocas de acusações entre eles.

Na Psicologia do Desenvolvimento estudam-se os mecanismos de defesa do ser humano. É natural que ajamos em todos os momentos, principalmente quando somos estimulados para isso. É também necessário que demonstremos, por meio de nossas atitudes, as insatisfações e as necessidades. Eu não ousaria discordar que, ao escrever aqui, posso estar me defendendo e também atacando. Muitas vezes, atacar para se defender revela nossas fraquezas e não nossas forças. Baseando-se em perspectiva comportamentais, psicanalíticas e educacionais, pode se afirmar que as fagulhas soltas por Caio Fábio e Ricardo Gondim são, efetivamente, reveladoras. Demonstram claramente o nível de fraqueza que eles têm acerca do Absconditus, principalmente quando eles não têm resposta para as incompreensões da ação divina na atualidade. É mais fácil nominar o próximo de bundão do que admitir ser incapaz de transcender a própria compreensão acerca dos acontecimentos apocalípticos. Gondim, ao deparar-se com a situação caótica pós-tsunami no Japão, abalou-se e revelou-se inconformado com Deus. É simples entendê-lo. Um dos níveis bíblicos de compreensão acerca de Deus é que Ele se revela na natureza (teofanias). Chuvas, trovões, terremotos, saraivas, maremotos (tsunamis), vendavais, etc são ações divinas primitivamente reveladas à humanidade. Deus é o trovão (Qol, no hebraico que significa voz). “Ouvi a voz do Senhor”, para uns, significa o barulho do trovão e, para outros, pode significar a destruição que esse trovão faz ao cair, em forma de raio, em uma árvore. Além das teofanias, Deus ainda fala por meio das epifanias e das ações apocalíptica (simbólicas). Certamente, essa última tem sido prato predileto de Caio Fábio e Gondim. O problema entre ambas reflexões não é teológica, nem eclesiológica. É política.

Seguramente, Caio Fábio preferiu pontuar esse “deslize” hermenêutico e lingüístico de Gondim do que exortá-lo com sabedoria. É penoso saber que Gálatas 5:15 seja a prática atual dos dois e de outros: “Se vós, porém, vos mordeis e devorais uns aos outros, vede que não sejais mutuamente destruídos”. Entretanto, o caminho do consolo é mais demorado. Optar pela acusação é mais rápido. Por exemplo, é possível perceber a enormidade de maledicências de Caio Fábio sobre Gondim em sua análise. Isso corrobora exatamente o que ele mesmo afirmou quando o declarou de bundão, ou seja, “pessoa sem coragem” (sem querer creditar o sentido pejorativo mais acentuado). Que autoridade Caio Fábio tem para chamar alguém com esse qualificativo? No mínimo, Gondim pode processá-lo na justiça, se quiser! E creio que a eclesiologia deles irá permitir tal desavença. Gondim, até onde sei, respondeu ao chamado de Deus. Para mim, tal atitude, além de obediência, é também a de coragem.

De uns tempos para cá, Caio Fábio tem optado pela crítica aos líderes evangélicos. Como sou professor de teologia, também opto por essa atitude, haja vista a crítica ser uma qualidade para os que sabem estabelecer critérios para fazer julgamentos. Entretanto, ao fazer críticas acerca de opiniões teológicas, exegéticas e evangelísticas, sempre tenho que pontuar para os meus alunos as regras para o julgamento feito. Sem a evidência dessas regras (diretrizes), fica difícil ajudar os meus alunos a tomarem decisões ou mostrar-lhes o mishpat (direito) bíblico. Por exemplo, são tão cruéis e destrutivas as falas de Caio Fábio sobre Gondim que, se eu tenho reservas sobre a Teologia Pessoal defendida por Gondim, sou capaz de revê-la somente porque achei Caio Fábio totalmente sem critérios de julgamento. Devo lembrar que, ao fazermos críticas, jamais atacamos a individualidade [da pessoa] (desculpe a redundância), pois demonstrarei minha fraqueza.

Vamos aos fatos. Qual meu nível de relacionamento e envolvimento com Caio Fábio e Ricardo Gondim? Nenhum. Sou estranho para eles. Posso ser um clandestino na embarcação que eles lideram. E como tal quero tecer minhas observações. Primeiro é com Caio Fábio e quero registrar dois grandes momentos. O primeiro foi quando ainda era jovem, cerca de 16 para 17 anos. Época de conversão, de discipulado, de dúvidas e de imensa vontade de servir a Deus. Fui discipulado por uma diaconisa de minha denominação. Como sempre gostei de ler, ela instruiu-me para a leitura bíblica e literatura evangélica. Na minha adolescência (dois anos apenas), devorei os livros da Editora Betânia e a maioria dos livretos de Caio Fabio. Era leitor e admirava-o como referência de liderança evangélica e o tinha como exemplo. Deus me conduziu, ainda jovem, para um Instituto Bíblico e depois para um seminário. Neste último, estudei de 1994 a 1995, em cuja ocasião tive acesso às excelentes teologias e respectivos teólogos, mas também observei o desfalecimento da liderança evangélica no cenário brasileiro. Minha denominação, assim como as demais, sofreu muito com as desavenças políticas e doutrinárias acerca do crescimento carismático e neopentecostal. Encontramos um fio de harmonia. Afirmamos a contemporaneidade dos dons. Mas a disputa de liderança continuou. Em uma denominação vizinha, houve problemas de imoralidade, outra crise. Muitos pastores tiveram crises nos seus relacionamentos conjugais e conseqüentes separações. Houve uma crise na Vinde. Caio Fabio sumiu do cenário evangélico. Retornou. Em sua volta, vislumbramos a diferença ministerial e perspectiva pastoral. Diferenciou muito claramente o sentido de igreja e comunidade (muito bem, por sinal). Optou por um ministério alternativo.

Meu segundo momento para falar de Caio Fábio foi em fevereiro de 2008, quando ele participou de um evento em Londrina. Naquela época, fui o único professor a deixar claro que “gosto de Caio Fábio e gostaria de ouvi-lo, mas não aceito a eclesiologia proposta por ele. Isso é por causa de um ponto de vista teológico, mas não ministerial.” Caio Fábio veio, falou, deu entrevista, polemizou. Também apontou excelentes alternativas para ministérios contemporâneos. Esclareceu posições e agrupou discussões acerca do seu estilo de liderança. Não tive contato direto, não o entrevistei, não conversei. Não tenho problemas sobre suas idéias, opiniões e desavenças teológicas. Minha única observação é que sua atitude (posição) assumida ultimamente tem enfraquecido a eclesiologia evangélica. Em muitas de suas análises eu concordo integralmente, pois há muitos lobos disfarçados de cordeiros no seio cristão. Só tenho reserva porque o achei tremendamente mal educado ao se referir ao Ricardo Gondim. Amanhã, serei eu a sofrer acusações, mas muitas asseverações acerca de minha conduta e formação evangélica são provenientes de Caio Fábio. Quem rejeita o passado não é digno de servir ao presente e poderá cometer o erro de destruir o futuro.

Sobre Ricardo Gondim, meu contato aconteceu em 2001, também na instituição que ensinava. Naquela época, o presidente do Diretório Acadêmico da instituição onde ensinei, entrou em contato com Gondim que, ocasionalmente, estava em Curitiba e que passaria por Londrina. Pela breve conversa que tiveram, ficou decidido que o mesmo falaria para os alunos naquela mesma noite. Devido a repercussão de sua passagem por Londrina, o evento foi feito em uma igreja local, devido as dependências serem maiores. Ele falou de sua experiência ministerial. Foi excelente. Nunca mais tive contato, exceto brevíssimas mensagens eletrônicas trocadas com Gerusa acerca de trabalhos acadêmicos, pois éramos colegas de pós-graduação em teologia. Gondim é, sim, expressão de liderança no cenário brasileiro e suas reflexões têm causado polêmica. Em meu entendimento, falta a Gondim maior exposição do seu pensamento. A superficialidade comentada por Caio Fábio o denuncia com excelentes intenções, mas que o coloca com pequeníssimos desvios eclesiológicos. Todavia, não há problema nenhum em ler poesia. Pelo contrário, é também um caminho que conduz ao drama do reconto. Afinal, a Bíblia é a poiesis contada pela genesis do narrador.

Surge, então, um impasse para mim: qual a pretensão de Caio Fábio e de Gondim? Não vejo nenhuma outra a não ser a de que cada um deseja projetar-se como referência no cenário nacional e atrair para si um elevado número de adeptos e constituir-se mentor de um paradigma pastoral e de liderança eclesiástica. Trata-se de uma estratégia política. E para chegar ao topo os obstáculos precisam ser eliminados. Caio Fábio escolheu o caminho de destruir os adversários (Silas Malafaia, Gondim, Terra Nova, etc), mesmo que estes tenham sido seus admiradores e companheiros de ministério no passado. Por exemplo, em uma das críticas que ele fez em seu programa ao R.R. Soares, Morris Cerullo, Silas Malafaia e outros sobre o levantamento de recursos, eu insinuo de que na última postagem do youtube 1/2 e 2/2 "a godinização", sempre aparecia no gerador de caracteres a informação de contas bancárias solicitando doações para vários ministérios. A mesma técnica usada pelos seus adversários também é utilizada por ele.

Algo ainda que vejo nos dois é que, embora estejam atualizados com a dinâmica e o desenvolvimento da eclesiologia contemporânea, todavia ambos não são pesquisadores natos. Caio Fábio é autodidata e merece ser reconhecido como tal. É um exemplo fortuito de que é possível conhecer e fazer teologia sem aprofundar-se em bancos acadêmicos. Todavia, a verbe academica do pesquisador não é adquirada apenas na participação, é preciso investigação crítica e científica - qualidade plenamente ausente nele. O mesmo vale para Gondim. Sua eloquencia é sui generis pastoral, encantadora, juvenal e carismática. Entretanto, precisa ainda ser depurada pela kriteria e pela produção teológica. Nesse aspecto, Caio Fábio leva vantagem. Ao brincar e manipular as palavras do nosso vernáculo, faz jogos estilísticos para conduzir os adeptos à produção de sentido única e exclusivamente proposto por ele. Gondim também não foge à regra. Com o estilo sintético e criador de ambivalências em seus textos, tem gerado nos leitores as lacunas da compreensão - eis porque ele mesmo foi capturado em sua própria armadilha de construção de um Deus pessoal. Com certeza, Gondim deve estar repensando a aporia "tragedia e sofrimento" em suas palavras.

Diante do exposto, minha sugestão é que ambos se perdoem mutuamente, sem tentar explicar o porquê das ressalvas. Eles precisam ater-se aos objetivos essenciais de seus ministérios e agregar forças sem destruir ministérios alheios. Nenhum dos dois e ninguém mais é senhor da verdade. Caio Fábio nunca disse a verdade. Gondim também não. Eu, muito menos. Cristo é a verdade. E, nesse sentido, somos a representação dessa verdade vivenciada pela realidade do Espírito Santo em nós. Para mim, por causa das acusações aqui e ali, a Verdade foi desvelada: estamos mutuamente nos destruindo e isso terá consequencias. Eu observo Caio Fábio, julgo e retenho dele as grandes bênçãos. O mesmo faço em Gondim. Para mim, eles são homens de Deus, sensíveis à voz da Verdade, humildes e redimidos pelo sangue de Jesus. Hoje, apenas se estranharam como Paulo e Barnabé, Paulo e Pedro, Paulo e João Marcos, Paulo e Félix, e outros. São irmãos e, logo, logo, saberão que se amam reciprocamente. E se isso não acontecer é melhor que eles fundem outra religião. E se eles não mudarem seus comportamentos e suas atitudes, são como lobos em peles de cordeiros e, verdadeiramente, falsos profetas.