Esta reflexão é iniciada com um axioma máximo: “as
quimeras em ambiente religioso é resultado das mitomanias absurdas ou ainda das
utopias divergentes”, decorrentes de outros segmentos sociais ou não. Afinal, o
brasileiro vive momentos de indecisão, ignorância e extremismos. Todavia,
reforça-se sempre em momentos de crise que são a coerência, a sabedoria e a
tolerância que devem imperar nos embates dialógicos. Não haverá paz nos poderes
democráticos se tais posturas não forem o princípio do convívio entre pessoas,
instituições e poderes. A sociedade sempre deverás ser definida pela sua
essência e decisão para o bem comum, para a coletividade e para os processos de
inclusão, harmonia e respeitabilidade. E com ousadia, é possível dizer que no
meio do povo de Deus, tal testemunho não é uma realidade.
A referência aqui não é à liberdade de expressão e
opinião, nem tampouco à opção política. Fala-se do direito e da liberdade de
viver em comunidade. A fé pode até ser individual, mas é no coletivo que ela se
concretiza. A inserção de pessoas no Corpo de Cristo é um ato único e
exclusivamente do Espírito de Deus. Obter o título de membro da igreja só é
válido quando tal membresia configura-se na apropriação de serviços,
compromissos e trabalho para o benefício de todos. Afinal, o ‘membro’ é parte
integrante do corpo. Separado, ele não serve para nada. Neste sentido, ser
membro de uma comunidade religiosa não é só pertencer à denominação, à
organização religiosa (e muito menos à referência de um partido político).
Significa sim aderir à fé que o consagra como membro de um organismo
essencialmente espiritual. Não somos membros por adesão, mas pela expressão da
fé que professamos.
Deve-se desejar ser membro de uma comunidade que
concentra em si todos aqueles que amam o bem, odeiam o mal, que se aproximam
sempre da verdade e se distanciam da mentira, que aspiram a decência e a ordem
e expiram a incoerência e a demência, enfim, todos aqueles que se transformam
diariamente em pessoas amáveis e dóceis e rejeitam os engodos da prática de
espiritualidade alienada. Sim, existe uma comunidade na qual há praticantes de
outras grandes religiões, tais como muçulmanos, judeus, budistas, xintoístas e
bahai’s; e também de dissidentes do próprio cristianismo, como os espíritas, as
testemunhas de Jeová, os da ciência cristã e os rosacrucianistas; e também
outros espiritualistas, como os da mitologia nórdica, os do teísmo aberto, os
messiânicos, entre outros. Deve-se aprender isto, pois viver em comunidade
significa expressar o direito e a liberdade da fé que se tem. A fé só é compreendida
como respeito porque a liberdade e o direito de viver em comunidade também são compreendidos.
E, seguindo este direcionamento, o fato de alguém
ter adotado Cristo e as Escrituras como hermenêutica das demandas sociais de
governo, cidadania, construção de vida e compromissos sociais não significa que
tal pessoa desrespeite o outro, ou até mesmo que o outro o desrespeita. Não se posso
adotar a teologia do extermínio só porque o outro é diferente (ou eu que seja
diferente para ele). A teologia defendida aqui e que se faz uso é sim a que disponibiliza
o viver em comunidade, respeitando as diferenças e usufruindo da liberdade e
direito que se tem. É uma teologia que dimensiona a convivência com os demais, através
dos olhos da fé. Por isto, cada um de nós deve tentar traçar a espiritualidade
a partir da sua própria humanidade, transformada pela realidade da fé na
convivência com pessoas. Este é o verdadeiro efeito da ação pneumatológica na
vida humana: a produção da paz do Espírito e a manifestação do fruto do
Espírito. Como humanos, precisamos aprender a interpretar a fé geradora da
comunidade, e não o caos que ela provoca.
Hoje, viver em solo brasileiro tem sido mais um
desafio da empregabilidade da fé do que propriamente das esperanças políticas.
Não há e nunca haverá esperança em projeto político – a esperança tem que ser na
fé que todo cidadão tem em si, mas que seja conduzida pela diretriz do benefício
ao próximo. As verdadeiras promessas são aquelas que emergem do espírito
messiânico, capaz de direcionar o povo à restauração integral. Já as promessas
políticas estão fundamentadas na defesa de grandes grupos economicamente
“poderosos”. E, possivelmente, nenhum de nós consegue pensar alguém sendo
conduzido à restauração, através do argumento de que o porte de armas trará
segurança. A maioria do povo tem o discurso pertencente ao grupo dos economicamente
“fracos”. Neste sentido, os programas políticos de recuperação do Brasil não é
e nunca será fundamentado na fé do povo, mas nos interesses de alguns “do povo”.
Considera-se aqui o conceito da fé comunitária ou coletiva, isto é, chegou a
hora de entender o povo brasileiro como a grande comunidade da fé:
revolucionária, libertária, acolhedora e cuidadora, inclusiva e guardiã da
vida. Há, portanto, mais povo de Deus fora das eclésias! A fé das comunidades
cristãs já foi anunciada por quase mais de 500 anos em solo brasileiro e,
durante toda esta jornada, ela alcançou outros arraiais. Sim, hoje é preciso
reler a fé do povo, a fim de que tais comunidades entendam o que havia sido há
mais de quinhentos anos.
Então, o fiel é chamado a ser cidadão do reino! E o
seu líder fora eternamente eleito como Salvador, cujo destino é religar a
criatura com o Criador. Logo, a igreja transparece a política quando ela
realmente defende os direitos para “os habitantes da pólis”. A semântica da
política projeta o cidadão a comportar-se como habitante do seu espaço de
experiência e vivência, a cidade. Consequentemente, a igreja, conhecedora da
política do reino, deve projetá-la para toda a criação de Deus. Não existe
reino de Deus apenas na “sala do trono”. Afinal, o comando do rei, decretado na
sala do trono, precisa ecoar e chegar até à extensão de todo o seu reinado. Afinal,
o Supremo Rei é movido integralmente pela fé do seu povo.
E por que isto não acontece? É porque o alinhamento
das propostas partidárias relacionadas às práticas e discursos de seus
representantes não coadunam com as do reino. O brasileiro vive a tragédia dos
vencedores pelo poder de governar: os ignorantes da fé. Tais líderes são
incapazes de discernir o caos, muito menos a competência de conduzir o povo
para a nova ordem. Na verdade, eles são os mágicos do espetáculo político, só
que utilizam efeitos cinematográficos. E, como não têm habilidades e nem
experiência de governabilidade, adotam discursos imaginários cujas metáforas são
resultados da irracionalidade promovida por dois esquilos animados, o Tico e o
Teco. Um deles, o Teco, adotou o estilo executivo despojado, cuja linguagem é difícil
de ser compreendida, agressivo e gosta muito de intimidar as pessoas. O outro,
o Tico, é legalista, ardiloso, vingativo e extremamente peçonhento. Mas ambos
têm carisma: o sucesso deles deve-se ao fato de encararem o povo como o Pato
Donald, do Walt Disney. Mas há um Donald, que não é pato e também não sabe
dialogar. E como há o maior de todos que não sabe governar, o Brasil resolveu também
imitar o primeiro mundo. Afinal, a fé deles é melhor. Lá, Deus salva, enquanto
aqui Ele é acima de todos. O caos já chegou. E quando o povo estiver na grande
tribulação, será preciso discernir a nova ordem.