quarta-feira, 15 de abril de 2015

Transparência






Amanhã, deixarei que me abram para que vejam aquilo que já sei. Afinal, os alquimistas conseguirão entender o que significa religiosamente viver a esperança dos sufrágios. Neste sentido, “abrir-se” é como uma desvelação humana, é como sair da existência para entrar na essência. O objetivo último de todos nós é tornar-se essência com o Numinoso. Não precisamos de diagnóstico, mas de diretrizes que nos colocam no caminho da eternidade. Ao deitar-me na maca, como cobaia da dessecação, serei corpo inerte, sem ação, sem vontades, mas estarei vivo porque artificialmente serei sustentado por máquinas e eletrodos. Estes últimos serão sensores, indicando minha existência... Porquanto, na anestesia do corpo, sentirei o silêncio ausentando-se da vida e presenciarei a chegada do aguilhão.

Por isto quem antecipa a intimidade com o Grandioso é, sem dúvida, os que já não conseguirão mais gozar desta felicidade carnal, nem desta nuance terrena de euforias sexuais e, nem mesmo dessa mistura de fluídos seminais e, muito menos ainda, dos sentimentos deleitosos. Eles são os que entenderam a missão sem fim, aquela missão que nunca atinge o alvo, nem cumpre profecias, nem realiza sonhos. Mas uma missão que inaugura novos alvos, novos desejos, novos sonhos, enfim, novas dimensões. A futuridade sempre se inicia com o fim dos guerreiros bravos, destemidos e fiéis. O único combate conquistado é o da fé: afinal, sem ela nem o amor próprio é conquistado, apenas se torna ludibriador das emoções e dos sentimentos.
 
E, como já disse, preciso ser aberto para ser revelado. Não é fácil ser transparente em mundo de opacidade. Não é vantagem querer ser feliz se o ambiente é de sofrimento. Nem é bom para a alma amar alguém que sempre irá te rejeitar. A transparência é a ilusão dos que buscam a verdade através dos comportamentos. “Quantos são os portais de transparência se é a corrupção quem faz iludir a própria verdade”? Para mim, a transparência é a satisfação plena que tenho, quando sei que há alguém em quem eu possa depositar todas as minhas inquietações: esse alguém sempre será o foco da minha verdade, da minha alegria e do meu amor. Transparência é a essência da felicidade, da verdade e do amor.


Todavia, há alguns que foram iludidos pela falsa transparência. Não se contentam com o meu testemunho. Eles precisam me abrir para encontrar as vísceras, as veias e os músculos. As vísceras, porque querem mexer nelas e fazer-me sentir o opróbio dos mortais. As veias, porque sabem que sou energizado pelos fluxos que dinamizam todo o meu organismo. E, dos músculos, porque querem me machucar, costurar, marcar, perfurar e desenhar. Tenho sido os “pings” e “pongs” das buscas pela transparência. Meu corpo é o fascínio de que há algo sobrenatural, enquanto minha alma é a secreta volição de minha essência. E o meu espírito, que diz-me acerca da eternidade, já vem dando-me a compreensão de que os axiomas dos que me rodeiam são “temporais”. Afinal, a minha competência foi compreendida como inimiga das vantagens e oportunidades. Eles não podem agarrá-las, e também não permitem que eu as tenha.  


Neste sentido, quando me abrirem, vão encontrar um espelho. Não o de Machado. Meu mesmo. Um que não refletirá a imagem, nem a essência, mas a autoimagem. Afinal, a transparência é o reflexo de si mesmo, conquanto nele mensura-se os valores que hão perpetuar-se eternamente.